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Relatório da Associação Internacional da Propriedade Intelectual

Colaboração: Sérgio Amadeu

Data de Publicação: 11 de março de 2010

RELATÓRIO DA ASSOCIAÇAO INTERNACIONAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL AGRADECE APOIO DE POLICIAIS AMIGOS E DIZ QUE APCM NÃO PROCESSA REDES P2P COM RECEIO DA OPINIÃO PÚBLICA.

O Relatório da INTERNATIONAL INTELLECTUAL PROPERTY ALLIANCE® (IIPA, Associação internacional de Propriedade Internacional) que trata da proteção e da denúncia da violação de copyright em todo o mundo teve sua última versão lançada recentemente com o nome IIPA's 2010 Special 301 Report.

Ao invés de reconhecer as mudanças e possibilidades que a Internet oferece para todas as sociedades, a articulação da MPAA, RIAA e da Business Software Aliance, neste relatório, assume integralmente o seu obscurantismo.

Buscando ampliar a criminalização de práticas coletivas e cotidianas de milhões e milhões de internautas, a IIPA, Associação internacional de Propriedade Internacional que no relatório 2009 fazia referência a necessidade de aprovar o AI-5 Digital no Brasil, agora chegou aos limites da agressividade.

Logo no início do relatório a IIPA afirma que

A "pirataria" como o conhecemos hoje em dia está ocorrendo de forma cada vez sofisticada, utilizando ou fornecendo aos usuários materiais sem autorização de direitos autorais sem autorização, ao invés de simplesmente realizar sua a duplicação e venda de conteúdo em mídia física nas lojas de varejo ou nas ruas. (...) Essa pirataria é feita de inumeráveis formas, do compartilhamento de arquivos P2P, deeplinking sites, compartilhamento BitTorrent, cyberlockers, quadros de avisos na web, e outros serviços semelhantes.

Na página 13 do documento que mais parece uma bomba, pois suas próprias frases são autodestrutivas e demonstram exatamente o quão absurda é a sua visão, temos

Na Espanha, com uma das taxas mais elevadas da Europa de compartilhamento ilegal de arquivos Europa, estima-se que as vendas de artistas locais do top 50 caíram 65%, entre 2004 e 2009. Na França, onde um quarto dos downloads na internet são ilegais, os álbuns dos artistas locais tiveram uma queda de 60%, entre 2003 e 2009. A situação do Brasil, país rico culturalmente, é semelhante.

Dois breves comentários. Primeiro, qual a fonte destes dados? A IIPA não diz. São projeções baseadas em premissas erradas, chutes de advogados em petições que seriam cômicas se não fossem obscuras. As pesquisas demonstram que as vendas de CDs por artistas caem muito mais em função da crescente diversidade de oferta de músicos ocorrida com a Internet do que com a cópia ilegal. O que a indústria do copyright não quer ver é a crise da intermediação. Antes as gravadoras controlavam quem podia e não podia fazer sucesso. Com a Internet, uma jovem banda não precisa mais pagar "jaba" para ser conhecida por milhares de pessoas na rede (vide Teatro Mágico, Móveis Coloniais, etc).

Segundo, repare no "tiro-no-pé" que é o próprio texto da IIPA. Ele chama claramente os milhões de jovens e adultos europeus que fazem download de criminosos. É óbvio que existe algo errado com uma lei que transforma a prática cotidiana de milhões de pessoas em crime. É nítido que ninguém acredita que o compartilhamento de bens culturais seja um problema social, ao contrário, se a IIPA conseguisse impor sua lógica aí, sim, teríamos um grave problema para a criatividade e para a disseminação da cultura.

Agora, reparem bem no longo trecho a seguir extraído da página 178 do relatório da IIPA, quando este se debruça sobre o Brasil:

Retenção de dados: a Business Software Aliance assinala que não há legislação específica que estabeleça um período de tempo mínimo para os provedores de Internet mantenham os registros das transações realizadas na Internet. Atualmente os provedores estão mantendo os dados para um período curto, o que torna difícil para acompanhar e investigar a pirataria nas redes P2P (idealmente tais dados devem ser conservados pelo menos durante 6 meses a 1 ano). Em um recente contencioso judicial iniciado por um grupo nacional da indústria fonográfica (ABPD) contra um grupo de uploaders de São Paulo, foi inviabilizado quando o Tribunal confirmou o direito do autor de obter as provas. No entanto, o provedor foi incapaz de fornecer os dados, tendo em conta o longo período passou para a resolução do recurso. O provedor de acesso simplesmente "perdeu" a informação enquanto se esperava decisão do recurso. Esta deficiência específica certamente pode frustrar os esforços desenvolvidos pela indústria fonográfica no Brasil para desafiar a troca em massa de arquivos de música ilegal que ocorre através das redes P2P. O Conselho Nacional Contra a Pirataria (SIC) deve dedicar recursos para a analisar a legislação pertinente, no Brasil, a fim de fornecer recomendações claras para uma solução destes casos.

Observe que a IIPA é a maior interessada na violação da privacidade e guarda automática dos logs de navegação. Ela conta com um poderoso lobby dentro da Polícia Federal e com o apoio de alguns membros do Ministério Público. A IIPA quer que o direito ao conhecimento, o direito humano à comunicação, à liberdade de expressão e o direito de navegar sem ser vigiado sejam subordinados à exigência de cerceamento das obras protegidas pelo copyright.

Sem dúvida, aqui temos a maior das aberrações. Veja, ainda, na página 178:

Execução penal: a APCM (uma ONG anti-pirataria) percebe que a pirataria na Internet não será a prioridade para a polícia, mas agradece o apoio de policiais de unidades especiais do cibercrime, tanto na polícia federal e estadual. Diversos processos penais foram realizadas em colaboração com a Polícia Federal e Polícia Civil contra os piratas da Internet que vendem DVDs piratas e aqueles que oferecem a venda de filmes pirateados através de redes sociais, como o Orkut. Atualmente, a APCM não está processando qualquer caso ilícito nas redes P2P, por causa das possíveis repercussões negativas com o público em geral e com o governo.

O documento não podia ser mais claro. Eles atuam dentro do Estado. Estas associações da indústria de copyright fazem a polícia agir de acordo com seus interesses. Por isso, querem uma redação genérica das lei de crimes na Internet, para poder agir e criminalizar práticas corriqueiras e comuns na rede. O mais interessante é que o relatório da IIPA reconhece que a ação absurda que a APCN desfechou contra a comunidade Discografias, no Orkut, foi um "tiro pela culatra". Apesar do relatório dizer que se vende músicas nas redes P2P, todos sabem que elas são compartilhadas generosamente, como ocorria na comunidade Discografias.

Precisamos ficar atentos, pois este segmento obscuro da indústria cultural e seus representantes sabem que não podem dizer tudo. Se escondem em redações marotas, em discursos em defesa das crianças, mas o que querem mesmo é implantar na Internet a cultura da permissão e colocar a criatividade sob o seu controle. Estamos alertas.

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