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Colaboração: Rubens Queiroz de Almeida
Data de Publicação: 05 de Abril de 2006
Na grande epopéia do povo romano, Eneida, escrita por Virgílio, encontra-se a frase: Eu temo os gregos, mesmo quando eles trazem presentes.
A história do Cavalo de Tróia é conhecida por todos. Ao que parece, estão fazendo outros usos da idéia.
Ultimamente, sempre que algum governo manifesta a firme intenção de adotar software livre em larga escala, presentes aparecem do nada. Milhões de dólares em software gratuito para uso educacional, ou grandes descontos, são oferecidos generosamente.
O caso mais célebre, discutido amplamente na Internet, foi o projeto de lei apresentado pelo congressista Edgar Villanueva, do partido governista, Peru Posible. Em seu projeto de lei era proposto o uso exclusivo de software livre no âmbito governamental.
A pressão que se seguiu foi intensa. O gerente geral da Microsoft no Peru, Juan Alberto González, escreveu uma carta ao congressista alertando-o dos perigos e do prejuízo que o Peru iria sofrer com a adoção do software livre. O embaixador americano em Lima, em carta ao Presidente, expressou sua surpresa que tal lei pudesse ter sido proposta. Bill Gates pessoalmente, visitou o Peru e ofereceu seu presente, U$ 550.000,00 em computadores com conexão à Internet.
China, Índia, Argentina, e muitos outros países estão adotando medidas semelhantes. Na China o presente é um investimento de U$ 750 milhões em três anos.
Na Índia, a cronologia dos eventos é particularmente esclarecedora. No dia 10 de outubro, o jornal The Inquirer publica um artigo intitulado India Moving to Linux, destacando uma iniciativa governamental declarando o Linux como sua plataforma preferencial. Em 11 de novembro a fundação William and Melinda Gates oferece um total de U$ 100 milhões para uma iniciativa para combater a AIDS. No dia 12 de novembro a Microsoft cria um fundo de U$ 400 milhões para o desenvolvimento de vários projetos na Índia e um fundo adicional de U$ 20 milhões para a disseminação de educação em informática nas escolas indianas.
A quantidade de dinheiro certamente é respeitável. Mas o que está por trás dos números? A doação pode trazer algumas surpresas desagradáveis.
Na Namíbia, uma instituição não governamental chamada SchoolNet recebeu uma doação bastante peculiar. A empresa ACER faria a doação de 50 laptops de baixo custo e a Microsoft faria a doação de seu software. A doação entretanto era apenas do pacote Office. A instituição teria que bancar os custos do sistema operacional, um pequeno extra de U$ 9.000. O acordo envolvia outros presentes os quais, tomados em conjunto, fariam com que a SchoolNet, para aceitar o presente de U$ 2.000, teria que desenbolsar U$ 31.000. A resposta, é claro, foi um educado não, muito obrigado
No Brasil, o projeto de lei do deputado Walter Pinheiro, que institui o uso preferencial do software livre em instituições governamentais, repousa adormecido em alguma gaveta, não tendo sido nem mesmo analisado pela Comissão de Ciência e Tecnologia do congresso. Estranhamente, nenhum presente aportou por estas bandas. Vamos ver o que acontece se este projeto sair da gaveta e realmente emplacar. Quais serão os presentes que receberemos?
Qual é, enfim, o objetivo de tanta generosidade? Simplesmente desmontar as iniciativas de popularização do uso de computadores nestes países, com soluções livres. O que estes governantes perdem de vista, ao aceitar tais presentes, é a visão de longo prazo. Países como o Brasil, possuem apenas cerca de 5% de sua população total com acesso à Internet. Qualquer presente, não importa sua amplitude, não poderá resolver este enorme problema. Sistemas operacionais proprietários são conhecidos por serem vorazes consumidores de recursos. A questão não é apenas o software, mas o conjunto. Para usar o presente faz-se necessária a compra de um computador de última geração que, em muitos casos, custa mais que toda a escola.
Edgar Villanueva, em entrevista para a Revista Wired, afirmou que a razão de tanta pressão não era o temor de perder o mercado peruano, que para a Microsoft pode mesmo ser considerado insignificante. O maior fantasma era o estabelecimento de um precedente, que pudesse ser seguido em larga escala por outros governos.
Soluções para escolas e instituições de baixa renda baseadas em Linux, além de serem plenamente funcionais, fornecem uma oportunidade sem igual para o desenvolvimento das mais diversas competências em tecnologia da informação. A flexibilidade de sistemas livres permitem que soluções sejam desenvolvidas muito rapidamente e, o que é mais importante, compartilhadas abertamente na Internet. Apenas para ilustrar a extrema flexibilidade de softwares livres, sistemas GNU/Linux oferecem suporte até mesmo para o idioma Klingon Lembram-se, da série de televisão Jornada nas Estrelas? No mundo do software livre o usuário tem voz. Tem liberdade para criar, aprender, ensinar e determinar seus destinos.
Saiba diferenciar o software livre e software gratuito. Em hipótese alguma aceite software gratuito. Só aceite aquilo pelo que possa pagar no futuro. O software gratuito só é oferecido no intuito de criar uma dependência. A conta, inevitavelmente, vai chegar um dia e você irá ficar em uma situação muito difícil. Felizmente o software livre nos oferece inúmeras alternativas. Não precisamos nos aprisionar, a não ser que o queiramos.
Se ainda assim ficar tentado, lembre-se dos gregos!
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