você está aqui: Home  → Coluna do Cesar Brod


De acordo com as Leis 12.965/2014 e 13.709/2018, que regulam o uso da Internet e o tratamento de dados pessoais no Brasil, ao me inscrever na newsletter do portal DICAS-L, autorizo o envio de notificações por e-mail ou outros meios e declaro estar ciente e concordar com seus Termos de Uso e Política de Privacidade.

Ficção Científica? #11

Por Cesar Brod

Data de Publicação: 09 de Fevereiro de 2010

As naves projetadas por Kazinski e sua equipe partiam do simples conceito "cebola". Cada camada protegia aquela que envolvia e era protegida pela que a envolvia. Os esforços e recursos gastos na construção de cada uma das naves eram irrelevantes face à missão de preservar a humanidade. As quatro camadas externas eram rigorosamente idênticas, extremamente resistentes e com sensores quadruplicados em cada uma delas. As conexões de cada sensor ao núcleo central de processamento, composto pelos cérebros modificados de dois cientistas voluntários, eram espelhadas. Além disto, cada sensor possuía, embutido, um processador convencional e uma unidade de comunicação. A ideia era que, mesmo que um grupo de sensores fossem arrancados, por algum acidente, eles fossem capazes de, enquanto ativos, enviar à nave dados relevantes sobre o que aconteceu.

Bem no centro da cebola estava a câmara de estase do piloto. Ao redor dela, sua área de vivência e exercícios. Na camada imediatamente superior, os dois cérebros que constituíam o núcleo central de processamento, devidamente conectados e também isolados. Na eventualidade da perda de um, o outro continuaria funcionando independentemente. No caso da perda dos dois, o piloto ainda estaria protegido por todo um arcabouço de inteligência artificial convencional.

Enquanto estivesse na câmara de estase, o piloto estava protegido pela mais avançada unidade de tratamento intensivo. Desde servo-mecanismos para massagens relaxantes, estimulantes e mesmo eróticas estavam disponíveis até os mais sofisticados nano-robôs para as cirurgias mais complexas já devidamente padronizadas. Todas estas coisas eram controladas de acordo com os sensores de saúde do piloto e o conhecimento da nave. Ainda que, desde o início do treinamento, houvesse a insistência de que a "nave" só seria chamada assim se um piloto estivesse nela, os próprios pilotos (centro da cebola) faziam a distinção entre eles mesmos e a "nave". Kazinski quis forçar este elo no momento da conexão do cérebro do piloto à nave mas, surpreendentemente neste caso, foi voto vencido. Até hoje dizem que foi uma questão política, que Kazinski não poderia ganhar todas. Até hoje há quem diga que Kazinski estava, mais uma vez, certo.

-oOo-

Iran era um menino e Freitas o empurrava em um balanço na cidade nova.

"Tudo a seu tempo, Iran! Tudo a seu tempo!"

"Como assim, nave?"

"Tudo a seu tempo..."

As cordas do balanço cortavam os anéis de Saturno, uma proximidade assustadora da Terra. Iran espalhava a poeira dos anéis, pegava pequenos satélites pedregosos com as mãos e atirava em Freitas, que divertia-se.

-oOo-

Iran havia sofrido um acidente de avião na segunda guerra mundial, na Terra. Estava debaixo de uma árvore. Havia perdido massa cerebral. No que restava da cabine do bombardeiro, Iran masturbava-se. Alguém perguntou seu nome e ele respondeu, com os olhos perdidos em um horizonte que desmanchava-se e reconstruía-se: G...arp!

-oOo-

Iran caminhava pelas ruas da cidade nova, mas elas estavam cheias de poeira, pedras e bolinhas de gude. Algo o compelia a atirar as bolinhas de gude na face de Hitler, mas Hitler era Kazinski. Uma raposa vermelha insistia em enrodilhar-se em seus pés e dizer que ele a havia cativado e que agora era responsável por ela...

-oOo-

Iran subia a escada de uma adolescência distante. À frente dele a guria que ele achava que era, garantidamente, sua namorada. A bunda da menina, iluminada pela lua, era o que ele mais desejava...

-oOo-

"Nave?"

"SSiimm, Iramnmn!"

"Eu sonhei!"

"Estam os c om p e quen os p rrr obleeee mas."

"Estou ainda em estase?"

"At é an t es d e c-o-m-e- çcçar os so so so nhos, estavas!"

"O que aconteceu?"

Uma série de sons incompreensíveis e em alto volume teriam feito com que Iran tivesse tapado seus ouvidos, se pudesse mexer suas mãos.

"Há mais elementos que influenciam na órbita deste planeta. Muita coisa que não foi detectada no mapeamento feito da Terra. Sofremos uma forte influência eletromagnética. O dispositivo que liberará as sementes está em ordem e funcional há 67 dias..."

"67 dias?"

"67 dias terrestres de acordo com meus cálculos, mas os sensores ainda necessitam ser instalados..."

"Pois abra esta minha câmara então e deixe que eu os instale!"

"Ainda não posso... Toda a ação gravitacional, a queda, você teve uma concussão no cérebro, seguida de uma grave hemorragia. Os nano-robôs estão cuidando disso. Os sonhos foram um bom sinal..."

"Nave, meus sonhos não tem relação nenhuma com nada do que eu tenha consciência! Eu tenho uma missão e preciso cumpri-la! É só isso que sei!"

Pela primeira vez o cérebro de Reuben não tinha como discutir com seu par. Ainda tinha o controle dos sedativos de estase e devolveu Iran de volta a seus sonhos. O cérebro de Reuben também não tinha noção de que, há poucos anos, havia sido Reuben.

Sobre o autor

Cesar Brod usa Linux desde antes do kernel atingir a versão 1.0. Dissemina o uso (e usa) métodos ágeis antes deles ganharem esse nome. Ainda assim, não está extinto! Escritor, consultor, pai e avô, tem como seu princípio fundamental a liberdade ampla, total e irrestrita, em especial a do conhecimento.

Mais sobre o Cesar Brod: [ Linkedin ] | [ Twitter ] | [ Tumblr ].

Veja a relação completa dos artigos de Cesar Brod